quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A HIDRA GREGA

Por Alexandre Mota


A dívida grega cada vez mais se assemelha ao mito de Hidra (o monstro com corpo de Dragão e 9 cabeças de serpente). O primeiro dos 12 trabalhos de Hércules era matar este monstro. No entanto, sempre que Hércules lhe cortava uma cabeça outra aparecia exalando um mau hálito mortal.

Acabou a questão da dívida grega?
No longo prazo coloca-se a questão da sustentabilidade da dívida que na nossa opinião está longe (muito longe) de estar assegurada com este acordo (sem surpresa já que este acordo não é para salvar a Grécia). Para além disso, não entendo que a meta deste acordo (uma dívida sobre o PIB de 120% em 2020) seja um resultado sustentável. Parece-me, isso sim, que não será atingida e, caso seja, não é sustentável. Teremos tempo para voltar e este tema.

A questão mais imediata (surpresa!) não está resolvida. No dia 20 de Março vencem 14,5 biliões de dívida e o acordo com os credores não está garantido (longe disso). Ainda esta semana a Grécia fará uma proposta que tendencialmente será respondia até dia 8/9 de Março. Tendo em conta os adiamentos recentes contemos com ziguezagues e algo de concreto mais em cima da linha de meta.

Mas porque não está resolvido?

Porque os detentores destas obrigações (hedge funds, bancos,…etc) vislumbram a possibilidade de as receber ao par e para tal até é possível que esteja reservado algum dinheiro deste novo acordo.
De qualquer forma, porque razão um detentor de uma obrigação+o seguro (CDS) entraria em acordo com o devedor, o que implicaria a não activação do seguro, quando pode maximizar o seu ganho de duas formas?
- esperando que as obrigações sejam pagas ao par;
Ou
- não entrando em acordo o que implicaria uma activação de um evento de crédito nos CDS

Complicado?

Até agora não. Então entram as cláusulas colectivas (Colective Action Clauses). Uma cláusula colectiva permite que uma reestruturação acordada por uma vasta maioria de credores seja extensível a todos os credores. Este é o busílis da questão: não se sabe se uma minoria de bloqueio pode impedir a activação das CAC`s e também não se sabe se não haverá uma imposição de CAC`s retroactivamente de forma a impô-las a todos os credores. Para complicar ainda mais a questão, não se sabe se a ISDA (entidade que se pronunciará sobre o eventual evento de crédito) vai ser imparcial ou vai defender os interesses da corporação que representa.

A Hidra grega está viva. O hálito é insuportável !
Hércules resolveu o problema queimando as cabeças da serpente em vez de as cortar. A última cabeça foi enterrada com uma enorme pedra…

P.s: abaixo um vídeo com um excerto de uma entrevista ao representante dos privados na reestruturação da dívida grega.

http://news.bbc.co.uk/2/hi/programmes/newsnight/9698394.stm
 

1 comentário:

José Dias disse...

Alexandre

No teu último artigo tocas em duas questões fundamentais: Colective action clause e ISDA.

O que eu acho inacreditável é o BCE ter removido as Collective action clauses nas obrigações gregas que detinha em carteira de forma unilateral e retroactiva e no processo tornou-se num credor preferencial. Isto é a negação completa do mercado. É bem revelador da desordem e falta de regras dos mercados financeiros nos tempos actuais. O episódio MF global enquadra-se na perfeição nesta nova ordem. Com um bocado de imaginação, é fácil ver como o tesouro americano vai conseguir pagar a dívida que tem vindo a acumular nos últimos anos…

A segunda questão prende-se com a International Swaps and derivatives Association. É esta a entidade que determina se os CDS são accionados ou não. Adivinha só que bancos estiveram a escrever CDS na dívida grega, sabendo à partida que estes CDS nunca seriam accionados………… GS e JPM………..Pois é…………Porque é que estes dois bancos venderam CDS sabendo à partida que a Grécia é impossível de salvar e o incumprimento é inevitável?

Isto só acontece porque estes dois bancos e a sua gente controlam a ISDA!

José Dias