quarta-feira, 28 de março de 2012

Gerir uma carteira de investimentos – um processo de descoberta

Por Alexandre Mota

A gestão de uma carteira de investimentos é uma missão desafiante. Para o iniciado ou mesmo para uma boa parte dos veteranos experimentados, a dificuldade começa exactamente pela ilusão de facilidade. De facto, aparentemente é cada vez mais fácil investir. Bastam poucos milhares de euros, um PC, um acesso online e, por último, uma boa dose de presunção decorrente da ideia feita: “o mercado é feito para ganhar dinheiro, isto é, para eu ganhar dinheiro”.

Gerir a nossa carteira de investimentos é um negócio com poucas barreiras à entrada, tendência que se acentuou bastante nos últimos dez anos. Os potenciais investidores passaram a aceder desde casa, do café ou do escritório, aos acontecimentos nos vários mercados e às notícias que influenciam o seu portfolio. À distância de um clique, os “Pequenos Soros e Buffetts” compram ienes, ouro ou petróleo, colocam e cancelam ordens, num frenesim de trading global e democrático.

A diversão que isto provoca não é indiferente ao comum dos mortais. É avassalador o efeito positivo sobre o ego de um ser humano, potencial investidor, provocado pelo poder de aceder aos mercados globais e tomar decisões…ao segundo. É avassalador o poder que alguma sorte (sim, existe sorte e azar) provoca na mente desses potenciais investidores que, depois de meia dúzia de negócios bem sucedidos, sentem-se capazes de tudo e acima de qualquer coisa.

Com o tempo virá a inexorável purga. Nessa altura, o investidor sério terá inevitavelmente que investigar muito bem os seus objectivos de longo prazo (fazer crescer as poupanças ou divertir-se?) e as suas competências (que mercados conhece? o que aprendeu com a experiência? que background técnico tem? conhece os instrumentos financeiros disponíveis e o seu potencial e risco? Fez o trabalho de casa? Tem algum plano? Que tempo tem para esta actividade? Que meios dispõe? Que custos tem?).

O investidor sério não se engana a si próprio. Procura incessantemente potenciar os seus pontos fortes. Com o tempo, a diversão deixa de ser o objectivo subliminar, mas sim a consequência colateral de um processo de investimento com a marca do sucesso. Com o tempo, nenhum investidor terá possibilidade de ser bem sucedido sem o conhecimento profundo dos mercados em que actua, sem disciplina, sem capacidade de adaptação às mudanças e sem uma filosofia de actuação adequada à sua personalidade e objectivos de investimento.
Para poucos o processo demora meses, para alguns mais demorará anos, mas para a maioria dos investidores esse processo de investigação nunca chega, nunca é feito. Esses seguirão os métodos e a filosofia de sempre. Obterão, como é óbvio, os resultados de sempre.

Para quem está disposto à ruptura, o primeiro sinal virá inevitavelmente com o choque da realidade: a primeira perda, a primeira grande perda. O impacto da primeira grande perda é profilático, quase milagroso. Por isso só alguns a sentem na sua verdadeira dimensão. A sua verdadeira dimensão começa por ser avassaladora sobre o ego outrora inchado, mas após alguma limpeza interior, o investidor sério que emerge estará sem dúvida mais preparado. Pelo menos percebeu que o mercado não existe só para ganhar dinheiro, mas também para lhe tirar dinheiro. E mais: se for suficientemente sério consigo próprio, concluirá que se continuar a actuar como sempre, o mercado acabará por lhe tirar mais e mais dinheiro até ao limite da sua capacidade financeira e mental. 

Após o primeiro choque ou, se for preciso, vários pequenos choques distribuídos no tempo, o investidor sério consigo mesmo perceberá finalmente quão difícil o mercado é e passa à fase seguinte. Nessa altura a frase “o mercado é feito para ganhar dinheiro” deixa de fazer sentido. A verdade é que o mercado existe para transferir dinheiro e fá-lo enviando cheques dos perdedores para os ganhadores.

Portanto, fiquemos esclarecidos para que serve o mercado. É uma máquina de eliminação dos perdedores, premiando os ganhadores. A sua função económica é facilitar os negócios e encontrar rapidamente contrapartes na alocação dos recursos. Não serve, caro investidor, para nos entregar um cheque de mão beijada.
Para sair vencedor tem de definir os seus objectivos e trabalhar nas suas competências. Contra si terá o poder de um conjunto de ideias feitas, vícios e mitos. Contra si terá a aparente facilidade que o acesso global permite. Contra si terá o barulho gerado pela sorte efémera de alguns mas, acima de tudo, contra si terá a sua natureza humana. Se perceber tudo isto (e rápido), tem fortes probabilidades de sobreviver e algumas probabilidades de se tornar um investidor excepcional.  

quinta-feira, 22 de março de 2012

DÉJÀ VU


Por Alexandre Mota

Sinais preocupantes na economia real

O PMI do sector transformador chinês, relativo ao mês de Março, saiu a 48,1, o quinto mês consecutivo de queda.

O PMI do sector transformador alemão, relativo ao mês de Março, saiu a 48,1 (esperava-se 51), segundo mês consecutivo de queda.

Complacência nas bolsas

O índice VIX estabilizou em torno de 15% (valores de 2007).
O índice VDAX está abaixo de 20% (valores parecidos com 2007 e 2008).

Conclusão: A economia mundial dá sinais de recuo. A China dá sinais de recuo. O mercado acionista está complacente, o que é visível (para quem quer ver para além da espuma da onda bull) no prémio que se paga por seguros de cobertura de risco de baixa de preço que estão a níveis historicamente baixos.

Exemplo: Em meados de Outubro de 2011, quando o medo imperava, se eu quisesse comprar um seguro de protecção total (ou seja, preço de exercício igual ao preço de mercado da altura) que me protegesse de uma baixa de cotação do índice S&P500, durante os 6 meses seguintes, pagaria 9%.
Ontem, a preços de fecho do mercado, o mesmo seguro custaria 4,5%.

Concretizando: comprar uma opção de venda (put) do S&P500 com preço de exercício 1400 e vencimento em Setembro, custa 4,5%

Desde Outubro, o S&P500 subiu 15,70%.

Portanto, o mercado está complacente, a economia está a derrapar, os bancos centrais já imprimiram e podem entrar em modo “pause”….

A sensação de Déjà vu face a 2007, 2010 e 2011 é inegável.

É altura de comprar seguros que cubram quedas nos próximos 6 meses.

Saber mais:

terça-feira, 13 de março de 2012

JAPÃO, UM DESASTRE PENDENTE

Por Alexandre Mota


·         O Japão tem o maior rácio de dívida pública em percantagem do PIB das nações desenvolvidas (ACIMA DOS 200%)

·         Historicamente a situação das finanças públicas tem sido contrabalançada com superavits comerciais, mas a situação já se inverteu
 
·         O saldo de conta corrente do Japão regista um deficit
 
·         O declínio da população e o seu envelhecimento colocará ainda mais pressão sobre as já debilitadas finanças públicas japonesas

Conclusão:
A situação actual é insustentável (e não é de hoje) e colocará sobre pressão vendedora o iene e as obrigações japonesas.

Ver video abaixo (Kyle Bass sobre a situação do Japão)



sexta-feira, 9 de março de 2012

PRINT+PAUSE+PRINT+PAUSE

Por Alexandre Mota


O Banco Central Europeu, depois de ter providenciado empréstimos de longo prazo ao sector bancário via LTRO 1 e 2, não está preparado para oferecer mais estímulos sem antes julgar o impacto das suas acções. Entretanto, o ónus é passado para os bancos e governos europeus.

O presidente do BCE, Mario Draghi, reconheceu que a economia europeia não fez mais do que estabilizar. A previsão de inflação foi revista em alta para 2,4% - acima do tecto de 2% do BCE.

O BCE parece satisfeito com o seu trabalho, reclamando os méritos de ter evitado um crash no crédito, estabilizando assim os mercados

Draghi não coloca de parte mais empréstimos (PRINT+PAUSE+PRINT+PAUSE) e declara que os efeitos dos LTRO`s são extremamente complicados e devem ser analisados cuidadosamente. Acrescentou que o aumento do crédito à economia demorará meses a ter efeitos visíveis nas estatísticas oficiais, sugerindo que mais LTRO`s não estão no horizonte imediato do BCE. 

Comentando a carta do presidente do Bundesbank, Jens Weidmann, que expressou preocupações sobre os riscos que estavam a ser corridos, Draghi referiu que vários membros do conselho de governadores mostraram preocupações semelhantes.

CONCLUSÃO:

Apesar do BCE estar satisfeito com o facto de ter providenciado fundos que os bancos precisavam, o mesmo BCE não está preparado para aumentar o seu balanço subsidiando os bancos ou fazendo o trabalho dos governos. O BCE inundou o mercado de liquidez, a “bola” está agora do lado dos bancos e dos governos.


IMPACTOS:

Com a impressora em modo PAUSE, os índices accionistas estão mais vulneráveis a uma correcção em baixa. Essa correcção já aconteceu nos primeiros 2 dias desta semana. C`est fini? On vera…

Nota: Importante a reacção aos números do emprego nos EUA (13:30)


quarta-feira, 7 de março de 2012

BOLSAS EM QUEDA: OS PORQUÊS


Por Alexandre Mota 


“A sabedoria convencional serve para nos proteger da penosa tarefa de pensar” - John Kenneth Galbraith

Em qualquer site de notícias encontrará, com certeza, uma “análise” que atribui a recente queda dos mercados accionistas a problemas na “negociação com os investidores privados da Grécia”. É verdade e é também a explicação convencional. Conforme tínhamos referido em posts anteriores, este assunto ainda não terminou.

Mas não é só este factor “inesperado” que ensombra os mercados.

Num estudo publicado ontem, a empresa de research “Capital Economics” titula: “FED waiting to see which way the recovery breaks”.

Depois desenvolve:

- FED não deve acrescentar mais estímulos enquanto os números mostrarem que a recuperação está em curso;
- É difícil ao FED vender o QE3 quando a inflação está em torno da sua meta;
- Mais acção é possível (leia-se QE3) mais tarde se a crise na zona euro entrar de novo em erupção

Traduzindo: é exactamente a minha linha de raciocínio nos últimos 2 posts. Para além disso, tal como em 2010, poderemos assistir ao seguinte paradoxo: ver o mercado accionista a reagir bem a dados macro maus e a reagir mal a dados bons.

Porquê?

Porque a principal razão que sustenta os preços das acções em alta é o modo de impressão em curso (o Ctrl+P). Se os dados foram maus (ceteris paribus), a impressora continuará em força. Se os dados forem bons (ceteris paribus), a impressora não deixará de imprimir, mas entrará em modo “pause”.

E na Europa…

Os depósitos junto do BCE atingiram novo máximo histórico. Em que dia? No dia 1 de Março, após o leilão do BCE que resultou num empréstimo a 3 anos à taxa de 1%. Portanto, os bancos pediram dinheiro ao BCE para…depositar no BCE.


terça-feira, 6 de março de 2012

SEGUROS

Por Alexandre Mota


"Pensamento duplo indica a capacidade de ter na mente, ao mesmo tempo, duas opiniões contraditórias e aceitar ambas” – Oscar Wilde.

Volto a usar esta citação porque penso que os mercados financeiros são uma arena em que a capacidade de construir e desconstruir o nosso próprio raciocínio é uma das condições necessárias ao sucesso.

Ontem titulei o meu post com a frase “As bolsas vão cair”. Quem leu o racional da ideia e os posts anteriores não pode encontrar contradição. Quem só leu o título, precisa de alguns acrescentos clarificadores.

Vejamos:
1) Eu penso que o Ctrl+P é o principal motor do bull market
2) Há indícios que o Ctrl+P vai abrandar
3) Sem Ctrl+P o mercado accionista cai
4) Se o mercado accionista cair, virá mais Ctrl+P
5) Mais Ctrl+P implica mais subidas do mercado accionista

Nota: Ctrl+P é um acrónimo para a política acomodatícia dos bancos centrais caracterizada por baixas taxas de juro e estímulos quantitativos.

Conclusão: no fim da história esta temática da impressão monetária é positiva para os mercados accionistas. No entanto, o ciclo das próximas semanas pode apontar noutro sentido. Uma das formas de monetizar esta visão é conciliar um portfolio de posições longas devidamente seleccionadas, com seguros que protejam uma queda do índice geral. Voltarei a este assunto.

segunda-feira, 5 de março de 2012

AS BOLSAS VÃO CAIR

Por Alexandre Mota


“Common sense is not so common” - Voltaire

O título deste post não é uma previsão, mas sim um exercício de bom senso.

Vejamos:
1 – A principal razão que tem sustentado o mercado accionista em alta é a temática da impressão monetária na qual os principais bancos centrais têm estado totalmente alinhados

2 – O mercado accionista subiu nos últimos meses antecipando/reagindo a esta política acomodatícia

3 – Para manter o programa de estímulos quantitativos, os principais bancos centrais precisam de justificação económica ou de um comportamento negativo dos mercados

4 – Os sinais macro são mistos, mas com o crude wti acima de 100 e o crude brent acima de 120, o receio de inflação pode refrear o ímpeto expansionista

5 – No curto prazo os bancos centrais sentem que cumpriram a sua missão: estabilizaram os mercados de dívida pública e empurraram as acções para cima

6 – É natural que esperem algum tempo para sentir o efeito das suas políticas

Conclusão: sem estímulos, as bolsas podem subir mais um pouco aproveitando o embalo dos últimos meses, mas tenderão a esbarrar em resistências cada vez maiores. Aumenta (e muito) a probabilidade de uma boa correcção em baixa nas próximas semanas/meses.

sexta-feira, 2 de março de 2012

O Seguro do seu Porsche

Por Alexandre Mota


Imagine:

….João é o feliz proprietário de um Porsche. Junto da sua seguradora contratou um seguro contra todos os riscos que garante ressarcimento no caso de acidente. Acidentes acontecem. Por isso, imagine o  acidente de João, sem dolo da sua parte, mas que, para todos os efeitos, transformou o seu Porsche num monte de chapa inútil. Depois de se recompor, João contactou a sua companhia de seguros tendo em vista a justa indemnização pela qual tinha pago um prémio avultado. Resposta da companhia de seguros: “Propomos uma troca. Vamos entregar-lhe um carro em perfeitas condições…um mini clubman de 1978!
Escandalizado, João contacta o Instituto de Seguros de Portugal que reúne um comité de avaliação (onde está presente a seguradora do seu Porsche). O comité decide (espanto!!!) que um mini clubman de 1978 é bem melhor que um monte de lata (outrora Porsche)…

Não sabemos como a história vai terminar, mas provavelmente o desenlace não depende do que é justo mas sim dos interesses em causa e da capacidade de mover as influências certas.
Esta história fictícia ilustra o que se passou relativamente aos Credit Default Swaps da dívida grega. A ISDA (entidade que decide se há ou não um evento de crédito) anunciou que o swap de dívida não representa um evento de crédito mas sim um acordo voluntário. Acontece que a história ainda não terminou e há um conjunto de detentores de obrigações que podem contestar o acordo de troca de dívida, o que levará ao accionamento de cláusulas colectivas e aí sim a declaração de um evento de crédito.

Por agora, se havia dúvidas, já tivemos um bom exemplo da sapiência da ISDA. Quem, depois disto, confiará no mercado de CDS arbitrado pela ISDA?

Ler Mais:

quinta-feira, 1 de março de 2012

DINHEIRO DE PAPEL VS ALTERNATIVAS

Por Alexandre Mota

Ron Paul confronta Ben Bernanke sobre o falhanço da moeda fiduciária ("paper money") e dá um exemplo de dinheiro verdadeiro "real money". Veja qual...