quarta-feira, 26 de setembro de 2012

A menina dança?


Por Alexandre Mota


“When the music stops, in terms of liquidity, things will be complicated. But as long as the music is playing, you’ve got to get up and dance. We’re still dancing.” – Chuck Prince, CEO of Citigroup, July 2007.

A citação acima está no topo do ranking das melhores citações sobre “como funciona o sistema”.

Os grandes bancos sabem que as suas decisões são arriscadas, mas não têm a disciplina para as evitar. Os gestores dos grandes bancos tudo fazem para insuflar as cotações das ações (pois têm, muitas vezes, o grosso dos seus rendimentos indexados à performance das ações) e esperam (sonsamente) que os supervisores controlem o mercado. Num típico comportamento de manada nenhum banco será especialmente criticado se fizer o que todos os outros fazem, mesmo que as decisões sejam desastrosas no longo prazo.

O problema estará na supervisão ou estará essencialmente na moral tóxica de tudo isto?

Se fosse permitido que os grandes bancos falissem, se não houvesse nenhuma mão protetora que os protegesse quando as coisas correm mal, o sistema estaria muito mais moralizado e os gestores seriam muito mais ponderados. Ora, atualmente não é isso que acontece porque o sistema está construído e é alimentado por uma evidente (e indecente) cumplicidade entre governos, bancos centrais e bancos.

Desde a crise de 2008, os programas de estímulos quantitativos nos EUA (QE1, QE2, Operação Twist e QE3) mantiveram a música a tocar. Todavia, a economia não melhorou. Para onde foi a música? Para o setor financeiro (ações, obrigações, etc). Na Europa os melómanos decidiram uma música diferente: só para os ajuizados e dignos; os outros terão de aprender a merecer ouvir sonatas.

Na minha perspetiva, tudo isto é perverso, a liquidez generosa não resolverá o problema de crescimento. Pior que isso, a excessiva liquidez, a par da moral tóxica referida acima, tenderá a desviar os recursos para atividades improdutivas, alimentar bolhas especulativas e, no final, originar uma nova crise. Pode, num cenário cada vez mais provável, originar estagflação (inflação sem crescimento).

Qualquer interveniente no mercado que entenda esta lógica perversa terá o incentivo a dançar enquanto a música está a tocar. Muito bem, enquanto a música estiver a tocar, há que dançar até porque não o fazer pode significar uma perda real.

Num cenário inflacionista, as obrigações e cash poderão revelar-se investimentos que resultarão em perdas reais de poder de compra (são aparentemente mais seguras, mas os retornos não compensam a inflação). Enquanto a música tocar (enquanto houver liquidez) o investidor que queira proteger o seu património em termos reais deverá considerar que é mais seguro investir em ativos reais, inclusive ações, do que em obrigações de alto rating.

Num cenário deflacionista, obrigações e cash serão os portos seguros.

Em qualquer um dos cenários, os metais preciosos afiguram-se como uma boa alternativa de investimento e um antídoto contra a impressão sem limites por parte dos bancos centrais.





terça-feira, 18 de setembro de 2012

IMPRIMIR


Por Alexandre Mota


As últimas semanas foram bastante profícuas no ambiente macro.

Em primeiro lugar, o BCE confirmou o que o mercado desejara e antecipara, designadamente: 


  • O BCE comprará obrigações de países periféricos e o Bundesbank é o principal opositor desta medida. A compra está condicionada a um pedido de ajuda financeira (“ou algo parecido”).
  • A ação centrar-se-á nos prazos curtos.
  • A intervenção será esterilizada, ou seja, o BCE removerá do sistema o mesmo montante de dinheiro gasto, assegurando que o programa terá um impacto neutro na massa monetária.
  • Não haverá uma banda explícita para os yields.
  • Não haverá senioridade da dívida comprada pelo BCE.

Os mercados acionistas reagiram em alta ao anúncio de compras de ativos pelo BCE e o EUR/USD atingiu os valores mais elevados desde Maio. 

Em segundo lugar, o tribunal constitucional alemão ratificou a tratado orçamental permitindo assim a participação alemã no mecanismo europeu de estabilidade. 

Em terceiro lugar, a reserva federal americana anunciou mais medidas de estímulo à economia americana – o QE3. A Fed vai aumentar a sua carteira de títulos de longo prazo através da compra de obrigações, designadamente obrigações hipotecárias (MBS) no montante adicional de 40 mil milhões de dólares mensais e deverá manter as taxas de juro baixas até 2015 o que significa mais uma ano face à promessa anterior.

Com os principais bancos centrais todos alinhados numa postura expansionista, a temática “RISK ON” prevalece. Os mercados já anteciparam uma boa parte desta decisão ao penalizarem o dólar em detrimento de outras divisas (como o ouro e prata) e ao beneficiarem os mercados acionistas em detrimento das obrigações de alto rating. Este movimento recente não se tem caracterizado por um grande clima de euforia nem altos volumes, o que deixa espaço para subidas adicionais das classes ativos que subiram mais recentemente. 

Imprimir é solução? Se estivermos a falar ao nível da gestão de ativos financeiros e solvabilidade do sistema bancário, a impressão tenderá a beneficiar as apostas de risco, afigurando-se assim como uma solução no curto prazo. Se estivermos a falar da economia real, esta impressão monetária não resolverá nada pois não contribui de forma alguma para o crescimento, podendo até agravar o crowding out entre investimento público e privado. Mais cedo ou mais tarde, a efeito ilusório dissipar-se-á e o próprio mercado financeiro entrará em crise. Uma crise ainda maior que a atual.